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Roels Jr., Reynaldo

E.A.F.. Rio de Janeiro: Centro Cultural Oi Futuro, 2005.

 

A pulsação é um dos elementos mais recorrentes na arte: fator estruturante -- quase universalmente explícito no discurso da escrita, da música ou da dança -- a pulsação é um pouco menos evidente nas artes plásticas, mas nem por isso deixa de se fazer sentir com freqüência. Quer sob a forma da exploração do ritmo gráfico, quer sob a da interação ativa entre campos cromáticos opostos, ela dota a experiência visual de um tempo que não lhe é de forma alguma estranho. Às vezes de maneira sutil e apenas perceptível, outras de modo enfático e quase hipnótico. Se isso ocorre, como alegam alguns, pelo fato de a arte nunca ter perdido sua relação analógica com a vida (do fluxo sangüíneo ao processo de expansão/contração do universo), pouco importa. O que interessa é a contribuição que o fenômeno traz à experiência artística, irredutível esta última, na sua essência, às próprias origens.

 

Pois é de pulsações que se constitui a mostra de Tina Velho. Pulsações orgânicas capturadas em situações domésticas relativamente simples, retrabalhadas e reprocessadas de modo a apresentar ao espectador não uma imagem qualquer do mundo, mas um discurso sobre a percepção mesma do ritmo e do tempo. Não são veias, vermes ou fluídos que ali estão apresentados, mas o próprio fenômeno do ir e vir, do pulsar constante, da afirmação de um tempo que se manifesta através de um movimento incessante. Trabalhos que discorrem antes sobre o tempo que sobre suas formas de manifestação na empíria do mundo.

 

Não é, contudo, este o aspecto que aparece de imediato no contato com as obras -- essas superficialmente dominadas pelo caráter tecnológico sob o qual são mostradas. Aí incluída mesmo, uma possível interatividade (hoje algo como uma palavra-de-ordem no campo da arte, tanto quanto em quaisquer outros). À primeira vista dominante, porém, a técnica funciona como uma espécie de amplificador do discurso da artista, como que um complexo estetoscópio da pulsação, que, ao contrário, só é percebido após o contato real , silencioso, entre o espectador e as obras.

 

As coisas ainda são pouco claras no campo (ainda muito incompletamente explorado) das relações entre arte e tecnologia. Em uma parte dos casos, conhece-se o instrumento sem saber bem o que fazer com ele; em outros, ele é utilizado como alternativa aos meios convencionais em situações igualmente convencionais. E é natural que seja assim, uma vez tratar-se de um recurso (ou de muitos recursos reunidos sob uma mesma rubrica), cuja aplicabilidade não é específica a nenhuma área, mas corta inúmeros territórios heterogêneos, sendo a arte apenas um deles. Não deixa, portanto, de ser sintomático que o sucesso dessa exposição se deva, em primeiro lugar, ao fato de vir de uma pessoa com formação inicial de artista, não de alguém versado na técnica e que se tenha secundariamente dirigido para a arte: com isso, ela sabe bem como questionar seus instrumentos em função de problemas formulados em um outro patamar intelectual; em segundo lugar, não conta menos o fato de ela participar de um grupo de outros artistas também dedicados à pesquisa sistemática daqueles recursos, e onde o confronto e a discussão dos resultados vai bem além de um simples "funcionou". Porque essa é uma exposição onde, em que pese o lugar ocupado pela tecnologia, esta última não chama a atenção sobre si mesma, e o peso final é determinado por um discurso visual e intelectual elaborado através dela, não em função dela.

2010 - present

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